terça-feira, 25 de junho de 2019

DOCE ILUSÃO

Há pouco mais de 8 anos, se minha memória não me trair, época em que recebi o diagnóstico de “estar diabético ou ser um diabético, enfim de que essa desgraça faria parte da minha vida, enquanto ela existisse”. Comecei uma trajetória que é bem própria da maioria das pessoas que recebem esse tipo de notícia, mudei hábitos alimentares, perdi peso rapidamente, adotei uma rotina de exercícios regulares e adicionei a minha existência o GLIFAGE. De certo que isso tudo resultou em quase dez quilos a menos, as taxas voltaram a patamares aceitáveis, principalmente a GLICOSE, e a vida ia caminhando sem maiores solavancos, assim eu achava!


Com a experiência adquirida em anos de pretensas bem e mal sucedidas inciativas de perda e controle de peso anteriores ao diagnóstico, eu já tinha plena consciência de que é absolutamente impossível viver sob um regime severo de controle absoluto de hábitos alimentares e atividades físicas indefinidamente, principalmente para mim que fui gordo na pré-adolescência e como já disse em outro post desse blog, tenho a cabeça de gordo, ou seja, penso em comida mesmo quando estou saciado e necessariamente sem fome, pois o ato de comer e curtir o sabor do alimento é verdadeiramente inebriante. A consequência disso é que com o passar do tempo há um relaxamento natural, e não dá pra negar, bem gostoso, onde você se dá o desfrute de comer um chocolate, tomar um refrigerante, comer um bolo, um doce, abusar um pouco no arroz, no feijão, no macarrão, que mesmo de vez em quando vai te fazendo um mal absurdo, mas como eu conseguia reverter a situação, digo melhor, baixar a minha glicose rapidamente, a "SEM-VERGONHICE ALIMENTAR, ia avançando e literalmente “me fudendo”.

Mesmo tendo em mente que desde o primeiro momento o médico me alertou que tais atitudes poderiam levar a danos irreparáveis, ou seja, o diabetes pode causar danos irreversíveis de toda ordem além dos mais danosos e conhecidos, relativos a problemas de visão, perda de órgãos amputados, problemas de desempenho sexual, que são os verdadeiros traumas já consagrados na sabedoria popular. Mas o que posso dizer é que para um bom comedor como eu, um verdadeiro glutão, há sempre uma dose de questionamento acerca do que é mais relevante, os prazeres da carne, da vida ou a melhor qualidade e ou quantidade de vida. Pode parecer um questionamento infrutífero, sem nenhum sentido, em que a resposta parece óbvia, mas de fato é algo que preexiste a nossa condição de seres pensantes.

O tempo foi passando e veio o aumento da dosagem do GLIFAGE (de um para dois e de dois para três, até chegar nos quatro comprimidos diários que passei a tomar desde a última ida ao endocrinologista), a adição do JARDIANCE e por último a ASTORVASTATINA CÁLCICA, e não tenho como contestar que minha capacidade de baixar a taxa de glicose foi drasticamente diminuída. Basicamente isso transmite a seguinte mensagem, cada vez que eu fizer alguma “merda”, leia-se sair da linha, do controle alimentar, poderei acarretar um dano muito mais sério ao meu organismo, e o que é ainda pior, poderá ser irreversível. Pois esse é em tese o desenvolvimento natural dessa praga chamada diabetes.

Aproveitei a consulta para fazer alguns questionamentos a minha médica, principalmente sobre a hipótese de que se eu conseguisse engrenar na minha atividade física, perdesse o excesso de peso e enfim fizesse uma dieta mais indicada a minha condição de doente crônico - fato este que felizmente já comecei desde o dia 23 de maio último e que espero manter indefinidamente - enfim se diante desse quadro eu poderia diminuir e ou eliminar algum remédio que tomo diariamente. A resposta foi desalentadora e devastadora para minha autoestima, e vou repassar na íntegra a seguir; “mesmo que você se torne um atleta de altíssimo nível, atinja o peso ideal, mantenha um controle alimentício 100% eficaz, ainda assim não seria garantia de eliminar um ou mais remédios, pois iria depender enormemente da reação do seu organismo a esse processo, e ainda afirmou que a hipótese mais eficaz para que eu me livre do uso de remédios é uma cirurgia bariátrica para “CURAR” o diabetes, bastante utilizada e que tem apresentado excelentes resultados, pelo menos no curto prazo, de cinco a dez anos”. Devo admitir que a ideia de cirurgia não me agrada nenhum pouco, mas como diz o ditado, “o futuro a Deus pertence”.

Rodolfo S Cerveira

sexta-feira, 14 de junho de 2019

O SONO BOM DE CADA DIA



Há uma certa crença popular que apregoa que os seres humanos só dão valor a muitas coisas que tem, principalmente as mais simples e comezinhas, a partir do momento em que as perdem, digo melhor, em certo sentido nós somos indivíduos muito acomodados e lenientes em relação as grandes benesses que nos foram concedidas desde o nosso nascimento e até mesmo àquelas que foram naturalmente agregadas no transcorrer de nossas existências. Na verdade, estou me referindo genericamente a vários aspectos da vida, tais como; nossos sentidos e percepções, o ar que respiramos, ao fato de afortunadamente estarmos saudáveis e sem dor, enfim a tudo que sentimos e usufruímos, e que muitas vezes não nos damos conta da sua devida importância.

Na presente resenha vou concentrar o foco no chamado SONO BOM, naquela faculdade maravilhosa de se desligar temporariamente de tudo, gozar de um merecido descanso e enfim retornar a velha rotina renovado. Pra você parece a definição de que? Especificamente? De um maná dos Deuses, de uma simples e boa noite ou mesmo de período significativo de sono reparador, ou de uma interminável noite sem conseguir dormir. Acredito que existem respostas das mais variadas para essa pergunta tão simples e banal, com causas e efeitos mais ou menos danosos a saúde e ao bem estar de cada um, afinal quem pode prescindir do bom sono?

A ciência afirma que são necessárias 8 horas de sono diárias em média para se manter uma boa saúde física e psíquica. Eu particularmente nunca dormi mais que 6 horas diárias, de certo que estou fazendo essa afirmação considerando o período que me lembro bem, a partir dos meus 6, 7 anos. A minha adolescência foi o melhor período de sono que já tive na vida, com certeza em consequência da minha intensa atividade esportiva de aproximados 2 horas diárias, como atleta de judô, depois como nadador e por último com as 3 a 4 horas diárias como jogador de voleibol, que perduraram até os 20 anos. Foi uma época memorável no quesito sono, pois eu literalmente deitava, mal terminava de fazer as minhas breves orações e literalmente “morria”, de tão pesado que era o sono, e renascia no dia seguinte, basta dizer que quase nunca eu lembrava de algum sonho. Algumas lembranças esparsas eram tão vagas que eu tinha dúvida de sua origem, seriam advindas de um sonho?

O tempo foi passando, me formei aos 21 anos, o foco da minha vida mudou sensivelmente, novas preocupações foram agregadas, casei aos 24 anos, aos 32 veio a primogênita, dois anos e três meses depois a segunda filha, o cerco das responsabilidades e preocupações foi se fechando e o sono já não tinha tamanha qualidade, nem mesmo igual quantidade, pois passei a dormir em média de 4,5 a 5 horas diárias. Depois dos 40 anos a descoberta da fatídica e incontestável hérnia de disco lombar, que segundo o meu médico em função de seu tamanho teria que receber um tratamento digno e sério para evitar muito sofrimento futuro (dor). Adeus a dormida de bruços, tão apreciada outrora, pois cinco minutos era o bastante para causar um incômodo terrível. De peito pra cima acabou perdendo o seu digamos “selo de validade”, explico melhor, deixou de ser uma posição bastante confortável, causando problemas depois de 15, 20 minutos. Logo só sobrou a chamada dormida de lado, com o famoso travesseiro entre as pernas. Resolveu? Não porque depois de um tempo na referida posição o peso do corpo começa a provocar dor no ombro e nos braços, resultando em uma intensa troca de posição durante boa parte da noite, o que ocasionou uma queda drástica da qualidade do sono, pois fica difícil nessas condições atingir o estágio de sono mais profundo. Há ainda um outro fator a considerar, as dores no corpo (ombros e mesmo na lombar, provocados pela hérnia de disco), diminuem a possibilidade de me manter deitado por mais tempo, portanto muitas vezes acordo mais cedo por causa da dor no corpo.

Alguns anos depois eis que se apresenta a desgraça chamada de diabetes, ai meu camarada, me perdoe o termo, “fudeu tudo”, pois além das limitações advindas da hérnia de disco e das inúmeras complicações que esta dita patologia pode causar na saúde de um ser humano, fui obrigado a passar a ingerir medicamentos que acabaram provocando um outro fator de depreciação da qualidade do meu sono, que é a necessidade de levantar pelo menos uma vez por noite para fazer xixi. Logo eu que nunca precisei fazer isso na minha vida pregressa inteira. Que merda!

Só para completar esse relato que acreditem ou não, não é um calvário, é a singela  realidade dos fatos, devo dizer que passei a acordar em algumas noites 3, 4 horas da madrugada, achando que ia ter um infarto ou coisa parecida, suando frio, com batimentos cardíacos acelerados, sem conseguir respirar e muito menos conseguir dormir depois do mencionado evento. Eis que chego ao diagnóstico de “síndrome do pânico”, mais uma MERDA para perturbar o meu tão almejado bom sono. De fato comecei a lembrar de alguns episódios esparsos na minha vida inteira, desde a infância, e conclui que a referida síndrome sempre esteve presente, eu só não tinha consciência disso. E reconhecer esses fatos foi fundamental para que eu continuasse mantendo ela no seu lugar, sem causar enormes transtornos e se Deus me ajudar espero não precisar recorrer a um médico para tanto.

Em outro post farei outros relatos acerca da síndrome do pânico, afinal aqui é um blog de um diabético que tem essa “porra” de síndrome também, fazer o quê?


Rodolfo S Cerveira

sexta-feira, 31 de maio de 2019

AMIZADE E IRMANDADE




Nesta semana perdi um querido amigo diante dos seus 51 anos de vida, literalmente na chamada “flor da idade”, para o câncer de intestino e estômago. Apesar de no meu subconsciente essa possibilidade nunca pôde ser descartada, pois tratava-se de uma enfermidade muito agressiva, em um lugar naturalmente de pouca expectativa de cura, e considerando o remédio indicado, a quimioterapia, que é igualmente invasivo e avassalador, a minha zona de consciência era povoada por um pensamento de que era preciso ter esperança de que o quadro pudesse ser revertido. Acredito que só a força do amor a vida que ele sempre demonstrou e a forte crença no milagre da cura dos seus parentes e amigos é que teimava em não encarar o quadro que se apresentava tão dramático.

Voltando um pouco no tempo, lembro de como se deu o nosso encontro. Na verdade, eu trabalhei durante quase quatro anos na mesma instituição com um irmão de sangue dele, e não fazia ideia desse pretenso parentesco. Nessa época minhas filhas eram pequenas e eu ia buscá-las no colégio todos os dias, coisa que ele também fazia diariamente para também buscar as suas duas herdeiras, e repetidas vezes o vi na frente do referido colégio e não podia deixar de notar sua enorme semelhança física com o meu amigo de trabalho, e isso me deixava intrigado. Enfim o tempo foi passando e um belo dia minha esposa me informou que a minha filha mais nova tinha um aniversário de uma colega de turma em uma lanchonete. Quando chegamos para buscá-la notei que a colega era justamente a filha daquele que eu sempre via e achava parecido com o meu companheiro de “trampo”, que não por acaso estava por lá também, o que levou-me a pensar que de fato se tratava de dois irmãos de sangue, o que pude comprovar naquele mesmo dia.

Como colegas de turma nossas filhas foram se aproximando e não demorou muito para que fossemos formalmente apresentados e a partir daí florescesse uma amizade muito intensa, para ser bem sincero, acredito que foi um verdadeiro encontro de almas afins, algo muito raro de acontecer, pelo menos nos meus 55 anos de existência não consigo reportar ter vivido mais de dois outros casos semelhantes, porém com toda a certeza em nenhum deles o sentimento de irmandade alcançou tamanha relevância, tão característica da presente experiência aqui descrita. A diferença sanguínea, de pensamento e de personalidades bem distintos, jamais foi um empecilho para o estreitamento da relação, que desde o início foi pautado pelo respeito e pelo apreço de um pelo outro. Durante mais de 10 anos essa amizade foi se fortalecendo, contando sempre com muito companheirismo e uma convivência muito prazerosa, fazendo com que o laço que nos unia se tornasse ainda mais forte.

Em pouco mais de um ano e meio, aquilo que começou com uma suspeita de ser um problema de refluxo, que o fez perder mais de 20 quilos e que chegou ao diagnóstico fatídico de câncer no intestino e estômago. Fez de seus últimos 45 dias de vida, período em que esteve internado em um hospital, um verdadeiro inferno austral, pois passou boa parte do tempo sedado, sem conseguir se alimentar, literalmente mantido vivo por suprimentos alimentares e soro, em função das intensas dores a que era acometido. O que ocasionou ainda mais perda de peso corporal, levando a sua morte no último dia 27/05/2019.  

Se nós seres humanos, conseguíssemos nos desnudar de nosso extremo egoísmo, conseguiríamos minimamente ser confortados com a certeza de que seu sofrimento atroz enfim acabou, e não estaríamos tão abalados e consternados com sua partida tão prematura, afinal não poderemos mais gozar de sua presença entre nós.  Espero sinceramente que um dia “oxalá” consigamos atingir esse estágio de evolução.

Só me resta desejar ao meu querido amigo e irmão, onde quer que esteja, muita paz e conforto no seu coração reconhecidamente tão grande, onde havia lugar para todos os que viessem ao seu encontro. Vá em paz amigo.

Rodolfo S Cerveira

sexta-feira, 24 de maio de 2019

UM BREVE ADEUS



A sensação de pertencimento é algo muito próprio do ser humano, faz parte de sua essência, mesmo que alguns tentem negar essa digamos “verdade absoluta”, se é que podemos efetivamente assim denominar. Ainda assim há uma série de conflitos e incongruências que precisam ser devidamente equacionados no sentido de possibilitar uma convivência relativamente harmônica entre os diversos “tipos de seres humanos”, que habitam nesse nosso plano. E só para reforçar essa ideia e corroborando com a máxima que diz que “ninguém é uma ilha’, o ser humano pode ser definido como um animal essencialmente social, que necessita viver na companhia de seus pares.

O momento do ADEUS, da partida, àquela hora em que você precisa dissociar-se da presença física de um desses seres humanos, “UNO”, verdadeiramente especial, aquele que se fez presente e relevante em sua vida, seja por suas ideias, seja por suas ações e posturas ou ainda pela sua maneira singular de ver e viver a vida. Enfim a dor de perder uma pessoa que tamanha representatividade tem e sempre terá na sua agora ainda mais ingreme caminhada, é desalentadora, mas de fato é algo que precisa ter o seu seguimento, seguir o seu curso, que por menos natural que possa parecer, é aquilo que não só os outros, mas acima de tudo você, espera de si mesmo.

Independente da religião, da crença ou da filosofia que cada um de nós esta intimamente ligado, reaprender a viver com a perda de alguém, com a ausência extremada, afinal não haverá uma segunda chance, é um processo doloroso e traumático e que requer uma extrema dedicação no sentido de nos readaptarmos ao universo do qual fazemos parte, refazendo nossos passos e redimensionando nossas metas, reconstruindo a teia inicial daquilo que nós temos de mais primitivo e genuíno.

De fato esse acontecimento tem reflexos em todos as áreas da nossa vida, mas em especial a nossa saúde física e psíquica é sem sombra de dúvidas, o ponto nevrálgico da questão. A forma como corpo e mente respondem a esses súbitos ataques externos é surpreendente sempre, sob todos os aspectos, ou seja, a forma como reagimos e nos posicionamos em relação ao ADEUS é um fator preponderante para a manutenção e ou preservação de nossa saúde em geral.

Como estamos falando de saúde, o meu companheiro inseparável e indesejável, o diabetes, não poderia ficar de fora, pois ele se faz sempre presente em todas as manifestações do meu corpo e da minha mente, queira eu ou não, goste eu ou não. Logo a maneira como eu vou lidar com o ADEUS também é um fator determinante da minha glicemia, que por sua vez é determinante para o bom andamento da minha visão, para o mais apropriado crescimento da minha próstata, enfim pra tudo quanto é “PORRA” nessa minha vida de diabético.

Eu não poderia terminar esta resenha sem fazer uma menção a “um breve adeus” a um querido amigo que se foi há poucos meses, com apenas 50 anos, que era diabético, que em função disso se fragilizou diante de outras doenças oportunistas, que fez escolhas bem diversas das minhas, mas que acima de tudo sempre respeitou as minhas escolhas, assim como eu respeitava as suas, o que acabou por nos tornar dois bons amigos. Que sempre viveu intensamente e desregradamente, sem nunca ter adotado nenhum cuidado ou restrição de qualquer natureza, em prol da preservação de sua saúde, muito pelo contrário cometeu os maiores desatinos alimentícios e comportamentais que se possa imaginar, principalmente quando lembramos de sua condição (diabético), e que por tudo isso acabou pagando um preço muito alto, nos deixando de forma tão prematura. Mas nunca durante toda a sua existência, da qual tive o prazer de privar, deixou transparecer a ninguém algum sentimento menor, seja de desrespeito aos seus pares, de falta de empatia, de apreço a dogmas e conceitos muito discutíveis, de ideias preconceituosas. Na realidade a mim parecia que a única lei a que ele se rendia era aquela que prega um imenso amor a vida acima de tudo e de todos, o chamado viver bem a vida, com a maior intensidade possível, não importando as consequências disso. Fique em paz meu amigo!

Rodolfo S Cerveira